obs:

O título desse blog é infeliz, mas só reparei depois. "Anti-país dos petralhas" dá impressão que sou contra os "petralhas" (como Reinaldo Azevedo se refere ao PT). Não, eu quis dizer que sou contra o Reinaldo e seu livro "O país dos petralhas".
É tão infeliz quanto uma pessoa de direita ser contra Marx e botar "Anti-O capital" e as pessoas acharem que a pessoa é anti-capitalista...
Bem, temos de conviver com os nossos erros né?

sábado, 10 de janeiro de 2015

a tragédia de Charlie Hebdo

(De coisas que escrevi no Facebook me colocando como quadrinista)
Se cartunistas morreram é como se colegas meus tivessem sido mortos, e é gesto bonito que muitos tenham feito cartuns em resposta ao fato. Contudo, minha opinião sincera é que não gostei da maioria do que foi desenhado, principalmente daqueles que colocaram pessoas com traços muçulmanos de um lado e artistas do outro, ou armas de um lado e lápis do outro. A bronca é principalmente em relação aos primeiros, pois acabei de saber que locais e símbolos religiosos muçulmanos foram depredados, e essa é uma reação irracional e que tem uma direção política, a dos xenofóbicos. "Ora, mas eu só fiz um cartum, não é essa a reação que quis estimular", espero não ouvir isso de cartunistas, e muito menos com a cara de que não estão levando a si mesmos (e seus trabalhos) a sério. (Até porque embora cartunistas e quadrinistas achem que é muita pretensão achar que arte muda o mundo, a arte muda o mundo sim, piada não é só piada, e etc, bem, mas deixemos esse debate de dentro da profissão para outra hora.)

Cartum é uma ideia, mas atenção: ideia simplifica e óbvia são diferentes. Nesse sentido, parabenizo o Latuff pelo cartum dos terroristas metralhando o jornal e os tiros atravessam e atingem uma mesquita. é simples, mas faz refletir. (uma coisa ruim de trabalhar com cartuns é que sempre vai aparecer alguém que vai dizer arrogantemente que já tinha pensado o que você desenhou, e que expressou por escrito, como se fazer por escrito por si só fosse um meio mais nobre, mais adulto! Ora, mas é mais fácil digitar do que desenhar!)


Bem, peço aos cartunistas que fiquem alertas, É um momento perigoso, setores políticos oportunistas estão se aproveitando para falar de suas ideias, tal como a Marine Le Pen, figura da extrema-direita francesa que fala em pena de morte.


Cartunistas retratam a realidade de uma maneira simplificada, mas têm de tomar cuidado para que isso não alimente a noção do que é o "óbvio" para os xenofóbicos.
Vendo a conjuntura (reações políticas e sociais), aparentemente a realidade é complexa, o realidade complexa não é um bom material para os cartunistas trabalharem em cima, pois o óbvio lhe escapa, por isso talvez seja prudente também ter a paciência e ver no que vai dar.


Notas (facebook):

1- Não deve estar sendo nada fácil para Marjane Satrapi, autora de Persépolis (HQ que virou Fime), iraniana que estudou na Universidade Islâmica Azad, atualmente vive em PARIS. Não duvido que ao invés de darem pesares pela morte de colegas da mesma profissão, até agridam ela!
2 - Eu não trabalharia na Charlie, ou se eu trabalhasse seria apenas para ganhar uns trocos, que realmente não curto nem acho justificável argumentos tipo "ah, os islâmicos eram zoados, mas os católicos e todos os outros também".
3- Tipo, se fosse os extintos Pasquim ou Paquim21, ainda daria mais orgulho, Pasquim principalmente, por causa da história (Glauber Rocha, Henfil, etc), um pouco menos Pasquim21 (Jaguar e Ziraldo em Pasquim21 faziam umas piadas que em quase nada diferiam daquelas da grande mídia). Em suma, Pasquim > Pasquim21 > Charlie
4- Opa, não que eu esteja posar de artista que escolhe onde publicar (pois só consegui publicar em 1 lugar, a Mad), mas como disse publicaria na Charlie apenas por uns trocos, não por concordar com a linha editorial.
5- Isso de "Somos todos Charlie", alguns dizem que é por causa das vítimas, outros complementam que é porque Charlie era de esquerda (desconhecia a publicação, então não posso confirmar), mas de qualquer forma, nunca concordei com essas campanhas "somos todos" nem "apoio incondicional"
6- Por exemplo, acho que o movimento feminista acertou quando não fez uma campanha "somos todas Geisi Arruda", se tivesse feito, estariam apoiando a Geisi em tudo, dando apoio incondicional quando ela foi para A Fazenda, etc. Ficaria muito esquisito para o movimento.


 Links:
(imagem acima  do The Gardian)
 Joe Sacco também se posicionou e questiona os limites da sátira em Opera Mundi


Ótima análise em Descurvo.

EXTRA:
Tava pensando a voltar a fazer quadrinhos em 2015, mas não imaginava que seria "empurrado" a voltar (senti quase obrigação de me posicionar).